bacyllus timoratus os 17 anos (ou 18? andava na terceira ou na quarta classe quando a minha irmã o trouxe? já ninguém sabe ao certo...) do meu gato começaram a cobrar algumas facturas ao bicho, desde que o calor se fez sentir mais. não há doença no carimbo, são os rins e o coração de um gatinho com idade. com este calor, menina... mas ele arrebita. julgo que sim. há dois anos aconteceu o mesmo. para já, dorme numa almofada de que se apropriou, abaixo do armário fotografado. entristece-me, não me surpreende que lhe custe a suportar o calor.
se aqui vim foi pelo que se passou no veterinário, reproduzível em qualqer cenário: com ou sem pêlo. quem tivesse visto o gato prostrado, de olhar mortiço, com o focinho rombo, a cambalear quando se tentava levantar, sentiria o contraste à entrada para a consulta: recuperou o olhar atento, o porte de felino vigoroso, pronto a atacar. o medo é um motor que não é do nosso tamanho, é uma potência elevada a nós mais qualquer coisa, ao mais infinito da nossa encenação interna. neste caso, demito-me de digressões sobre a imaginação de um gato, sendo, no entanto, óbvio que estava tomado pelo medo daquele espaço vestido de bata verde e de húmus de inox desinfectado. apesar da falta de forças, não parou de rosnar - trata-se de um gato, mas este rosna, é o verbo mais fiel - animado pelo arrepio de ali estar. o medo é um motor. naquele instante, em que a veterinária o auscultava, sob rosnares e tentativas de arranhadela, com uma luva quase de falcão, lembrei-me, por oposição, de contrastes de estados movidos pelo amor, que oxigenava outras coragens e operava outras metamorfoses. cheguei a não ouvir completamente como dosear a medicação a ser feita. porque o medo é um motor. de repente, não me conformava com o facto de que o medo pudesse ser um motor. já o sabia. quem não sabe? quem nunca lhe fez reverência? mas aquele olhar felino espelhava a vibração do temor em bruto, de modo visceral, era um recorte faiscante de agressividade no focinho. procurei dentro de mim momentos em que o medo tivesse sido um motor, enquanto continuava a olhar o ar assustado, mas pujante do animal. o medo é um motor. não queria. não gostava de encontrar momentos de metamorfose por causa do medo. não queria. não quero que o medo seja um motor. desculpe, o que dizia sobre este comprimido amarelo? toma meio por dia? posso misturar com comida?
exacto, vou escrever aqui. não deixe esta carteirinha acabar, venha cá buscar outra durante a próxima semana. vai ver que logo à noite ele já arrebitou. obrigada por avisar. chegam aqui donos com autênticas feras e não dizem nada, andam os bichos por aqui aos pinotes...
a luva de falcão era bonita. a veterinária foi arrumá-la a um canto e fechou a porta.
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