quinta-feira, janeiro 06, 2011

pós-guerras

A crise militar acabou, talvez; divisa-se a crise económica em toda a sua pujança. Mas a crise intelectual, mais subtil, e que, pela sua própria natureza, reveste as mais enganadoras aparências (pois passa-se no próprio reino da dissimulação), essa crise dificilmente deixa discernir o seu verdadeiro momento, a sua fase.
Ninguém poderá dizer o que estará manhã vivo ou morto em literatura, em filosofia, em estética; ninguém sabe ainda que ideias e que modos de expressão hão-de inscrever-se na lista das perdas, que novidades serão proclamadas. (…)
Os factos, no entanto, são claros e impiedosos: há milhares de jovens escritores e de jovens artistas que morreram, há a perdida ilusão duma cultura europeia e a evidência da capacidade do conhecimento para salvar o que quer que seja; há a ciência mortalmente atingida nas suas aspirações morais, e como que desonrada pela crueldade das suas aplicações (…). A oscilação do navio foi tão forte que mesmo as luzes mais firmemente seguras acabam finalmente por dar consigo em terra.

Paul Valéry (poeta e ensaísta francês, 1871-1945), La Crise de L’Esprit, 1919

1 Comments:

Blogger Keila Costa said...

E como nos afeta esse modo...essa condução incontida, essas inconsciências...
Beijo Icendul

09 janeiro, 2011 20:15  

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