quarta-feira, janeiro 30, 2008

permanências
como ainda não sei explicar bem a sensação, esboço um sumário da impressão que me fica do nó comum ás conversas dos últimos tempos.
ainda anda. ainda procura. ainda pergunta. ainda está. ainda faz. ainda vai. ainda sobe. ainda desce. ainda veste. ainda despe. ainda lava. ainda suja. ainda diz. ainda escreve. ainda explica. ainda ouve. ainda canta. ainda come. ainda bebe. ainda fuma. ainda grita. ainda sussurra. ainda beija. ainda coisa. ainda sua. ainda coça. ainda penteia. ainda corta. ainda corre. ainda abranda. ainda cozinha. ainda convida. ainda é convidado. ainda liga. ainda atende. ainda tira. ainda mete. ainda bufa. ainda sorri. ainda segura. ainda larga. ainda engonha. ainda despacha. ainda esconde. ainda assume. ainda desenha. ainda foge. ainda tem medo. ainda afronta. ainda cai. ainda dobra. ainda rasga. ainda cola. ainda ainge. ainda tinge. ainda esfrega. ainda. ainda é o quê?

10 Comments:

Blogger E. A. said...

O "Ainda" é terrível, porque é a expressão do tempo, e não de um contra-relógio que nos martela um fim final, pois se fôssemos imortais, o "ainda", ainda assim, subsistiria, mas é representativo do tempo enquanto tal: o horizonte que nos demarca.

31 janeiro, 2008 12:33  
Blogger icendul said...

e se formos imortais, sem sermos imutáveis? mas isso era outra história e a deste post é a da imutabilidade, ou da incapacidade de reconhecer a evolução dentro da permanência;)

31 janeiro, 2008 15:20  
Anonymous Anónimo said...

Do outro lado da península, os meus votos de feliz aniversário ;)

31 janeiro, 2008 22:14  
Blogger lupuscanissignatus said...

Fado?...

Enfado?...

Fatalidade?...

Ainda é palavra que. Suspensa. Não anda...ainda...:)

31 janeiro, 2008 22:40  
Blogger icendul said...

yashmeen: muchas gracias!
e bom ano para ti desse lado*

lupus: não pensava na permanência vista com enfado, mas numa certa imutabilidade que não se percebe bem onde leva e o que faz de nós.não deixa de ser fado, mas não era o que queria destacar:)

01 fevereiro, 2008 12:49  
Blogger André Dias said...

"ainda" expressa uma continuidade, um arrastamento até, em tempos de mudanças súbitas aparentes. talvez tenhas ganho maior apreço pelas rupturas. "ainda não", por exemplo, quer dizer a continuidade do negativo, a simples expectativa, afinal.

04 fevereiro, 2008 17:49  
Blogger icendul said...

olá, andré:)

tenho tomado mais consciência da evolução decorrente das rupturas, podendo estas serem ciclos de dor e desorientação atroz, são também dobradiças para o abrir de portas. depois de se perceber a geomteria da linha de curso, por analogia com períodos anteriores (e aqui alguma idade dá jeito, eu sou bastante pequenina na matéria)é "só" treinar o apaziguamento a cada nova onda.

[espero que o ciclo da Nova Escola de Berlim se tenha desenrolado de acordo com as tuas expectativas. uma curiosidade: estudas/te no Goethe?]

05 fevereiro, 2008 12:26  
Blogger André Dias said...

por mim preferia que as rupturas introduzissem novas sombras na claridade da vida. há uma grande incompreensão na compreensão. e não sei se sei o que é ser-se pequenino em matéria de idade. por vezes tenho a sensação que se nasce já velho...

[o ciclo correu muito bem, em público e de acolhimento dos filmes, o que mais importa. fiquei com a sensação que as pessoas gostaram de conhecer estes filmes. que, de certa forma, deles precisavam... aconteceu, no entanto, uma coisa estranha: percebi que os alemães presentes reagiam de maneira muito diferente às situações que estes filmes, talvez mais radicais do que parecem, convocam; por vezes riem-se de nervoso perante a mais simples intimidade, como uma mulher dizer a uma avó que acorda que ela é muito bonita, ou uma personagem infeliz cair inesperadamente de uma varanda e quase morrer. só quando um coelhinho armadilhado (os animais) as engana, é que largam esse insuportável riso protector. enfim, nada há de mais estranho do que as pessoas...]

beijo, andré

09 fevereiro, 2008 15:13  
Blogger icendul said...

creio que foi o lobo antunes que ouvi dizer, há tempos, que cada indivíduou já nasce com uma determinada idade. entendo. mesmo assim, acho que a espessura do livro que já vivemos, ajuda, pq confere padrões de desenvolvimento de situações. é claro que cada um poderá tirar proveito e ilações diferenciadas em profundidade das experiências e é aí que acabo por concordar em certa medida ctg e com o senhor lobo. a sombra, como produtora de contraste, ajuda a compreender melhor os planos. quando me referi a luz não descartei isso como mecanismo auxiliador da chegada ao entendimento.
a relação dos alemães com os animais é um tema de estudo complexo. já presenciei situações que me levaram a crer que são capazes de se angustiar mais com um achaque do gato da casa do que com um filho doente. não quero emitir juízos sobre isso, partilho, apenas. é curioso.

boa semana e obrigada pelo detalhe das inquirições no teu cantinho:)

10 fevereiro, 2008 22:50  
Blogger André Dias said...

a relação com os animais, diria que se vai tornando algo de bastante mais do que apenas curioso. e não diria de todo que é um exclusivo dos alemães, ou sequer uma sua particular tendência, esta estranha relação com os animais domésticos, que se manifesta numa hiperafectividade de contornos infantis. tenho escrito um pouco sobre isso: « os animais» e «zoofilia» [este último até atraiu "novos públicos", digamos assim]. não tenho portanto o teu pudor em ensaiar uma sua avaliação (que não um juízo). creio que é um dos sintomas mais evidentes de que algo está muito mal neste nosso reino biopolítico, de resto cada vez mais indistinto. o modo como as pessoas reagem à simples presença dos animais nos filmes é impressionante, como se, apesar ou sobretudo pela sua matança industrial, a consideração da sua vida não fosse passível de qualquer ambiguidade (o que não acontece de todo com a figuração humana). estou muito curioso para ver como reagirão ao primeiro filme do ciclo «figuras da autópsia» na cinemateca em março, que quebra alguns aspectos desta "invisibilidade" no domínio da experimentação animal. talvez as pessoas queiram manter a sua inocência ou ignorância. em todo o caso, estamos a chegar a um ponto no mínimo paradoxal, entre os extremos da infantilidade com que se tratam os animais domésticos e a industrialização da morte dos animais de consumo. e este paradoxo pode acabar muito mal. os sintomas estão aí, para quem os quiser ler. e não há (bio)ética que nos valha...

[desculpa o "sermão", que vem, no entanto, a propósito, pois tocaste num ponto que me é (muito) sensível]

11 fevereiro, 2008 12:15  

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